quinta-feira, 26 de julho de 2007

O país das chuteiras (femininas)

Marta, Cristiane, Cylene, Daniela, Andréia, Aline, Pretinha... alguém já ouviu falar dessas meninas antes de começar o Pan? Talvez. São as meninas da nossa seleção de futebol feminino e que fizeram a melhor campanha coletiva nesse Pan, pois ganharam todas as partidas - fizeram 33 gols, não levaram nenhum, com uma média espetacular de mais de 5 gols por partida (fizeram 11 na Jamaica e 10 no Equador).
Hoje, essas meninas valentes, aguerridas, desafiadoras e talentosas ganharam a medalha de ouro contra a seleção norte-americana, considerada a melhor do mundo, campeã mundial e olímpica, blá-blá. Tá certo que parece que os Estados Unidos mandaram o time B, mas mesmo o time B deles impõe respeito. Aliás, nunca entendi isso de os EUA sempre mandarem os times Bs para os jogos pan-americanos, talvez seja porque nos considerem atletas de segunda categoria e não mereçamos ter o privilégio de enfrentar o seu time A. Mas mesmo que viesse o time A, tenho certeza de que ele se intimidaria com essas brasileirinhas lutadoras, oriundas de famílias pobres do nordeste e do interior deste País, que enfrentaram preconceitos de toda a sorte para chegar aonde chegaram. E, ainda hoje, com todo esse potencial, esse talento e essa garra, jogando como jogam, não contam com patrocínios, nem apoios de empresas ou dos governos, a maioria delas nem tem onde trabalhar aqui dentro porque não há interesse em estimular o futebol feminino neste País, onde predominam as chuteiras masculinas. Uma das exceções é a nordestina Marta, eleita a melhor jogadora do mundo no ano passado, pela Fifa, e com uma carreira sólida na Suécia. Katia Cilene lembrou que precisou se vestir de menino para poder treinar e enfrentar o preconceito na sua cidade, já que futebol é para homens e não para mulheres.
Pois bem, essas meninas deram, hoje, uma lição em todos nós. Mostraram, jogando, pois é isso que elas fazem melhor, que devemos prestar mais atenção nos outros esportes em que somos muito bons. Elas nos lembraram que o Brasil não é feito apenas de bola nos pés de machos. Há outros esportes - futebol feminino, basquete, atletismo, karatê, TaeKwon-Do, ping-pong, badminton, etc. - que esperam por nossa atenção, nosso apoio, nosso reconhecimento, nosso patrocínio.
Foi emocionante ver o Maracanã com 70 mil pessoas gritando por Marta, Cristiane, Pretinha, Daniela, nomes que não estamos acostumados a falar nem a ouvir, porque estivemos meio cegos e surdos para outros atletas que não fossem Ronaldinhos, Kakás, Adrianos e Robinhos. E porque torcemos por chuteiras masculinas - que nem sempre nos merecem.
Infelizmente, por aqui, poucas chances têm os outros atletas de crescerem, serem patrocinados e se profissionalizarem, como acontece nos Estados Unidos, Rússia, Cuba, Canadá, Inglaterra, Hungria, Suécia, só para citar alguns países onde a atividade esportiva é levada a sério desde a escola primária. Assistimos há anos os EUA e Cuba liderarem as competições mundiais. E isso cansa.
Por isso, o mérito dessas meninas da seleção feminina do futebol foi retumbante. Não só por terem ganho a medalha de ouro contra o melhor time do mundo (?), contra a poderosa seleção dos Estados Unidos, mas por terem chegado aonde chegaram, sem levar nenhum gol, fazendo inúmeros contra as outras e sem queixas, sem lamúrias, sem frescura. O único choro visto naqueles rostos foi a expressão da alegria e da emoção. Será que alguém do governo, da mídia e das comissões técnicas prestou atenção no recado dado por elas?

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