quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Poucas palavras

Em tempos de Twitter e Facebook, são poucas as palavras que sobram para um pobre blog.

Sydney

Austrália



Bondi Beach - Sydney

Cenas de um casamento






Casamento de meu sobrinho Iura em Kings Valley, estado de Victoria, Austrália. Na foto: a tia (eu), minha mãe Elizabeth, a noiva Alice, o noivo Iura e a mãe do noivo, Margaret.

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Pobre guarda-chuva

Não lembro mais qual foi a última vez que choveu em São Paulo. E estou falando sério. O tempo seco, a falta de chuva, a umidade relativa do ar abaixo dos 20% têm sido temas recorrentes dos noticiários de televisão e jornais por aqui. A TV fala que não chove há 45 dias, eu não acredito. Pra mim, faz um século. Só vemos gente de queixando de dores de cabeça, com garganta seca, coceira nos olhos, no corpo, cansaço, hospitalizações de crianças com problemas de asma, alergias, rinites, faringite, pneumonia, e sei lá mais o quê. As roupas úmidas no varal secam em menos de duas horas. A gente respira um ar podre, cheio de partículas venenosas, ozônio, monóxido e dióxido de carbono, gases que nos fazem mal e não nos deixam respirar. O horizonte desapareceu de São Paulo há tempos e o que se vê é uma nuvem preta e densa sobre nós. O Céu? Onde ele está? Difícil dizer se aquilo lá em cima já foi azul um dia.
Nunca pensei que depois de morar em um dos lugares mais úmidos do País - Florianópolis, onde a umidade relativa do ar é de 80% o ano todo - eu invejasse aquele clima e a chuva que cai por lá. E onde foi parar o inverno? Meses de julho e agosto com temperaturas acima de 27 graus, sol forte e tempo seco! E a gente olha, atentamente, pra tevê todos os dias, na esperança de que a moça do tempo nos dê um alento e anuncie uma chuva daquelas boas, de lavar as ruas e a alma. Se isso acontecer terei de comprar um guarda-chuva novo. O meu, coitado, de tão guardado e abandonado, morreu de solidão.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Outubro de 67

Os festivais de música brasileira da década de 60 - organizados pela TV Record, Excelsior e, depois, Globo - eram uma válvula de escape para o povo naquele período da ditadura militar. Acho que, guardadas as proporções, esses festivais mobilizavam tanto as pessoas como, hoje, a Seleção Brasileira na Copa do Mundo, o reality Big Brother e um final de novela de Gilberto Braga.
Havia, nos festivais, uma atração à parte, além das músicas e artistas que pisavam no palco do teatro Excelsior. Era a vaia. Era quase uma instituição, as pessoas liberavam seus instintos mais baixos para vaiar uma música, um intérprete, um arranjo que foi alterado. Os cantores tinham verdadeiro pavor de participar do festival justamente por causa da virulência do público - mas não perdiam a oportunidade, porque era ali que as coisas aconteciam. Suas músicas poderiam sair consagradas daquele teatro - como aconteceu com Roda Viva; Alegria, Alegria; Domingo no Parque e Ponteio, clássicos da MPB hoje. Valia a pena arriscar e ouvir um úúúú.

Eu e minha família aguardávamos com ansiedade o dia da festival na tevê, fazíamos apostas com os amigos e vizinhos sobre quais canções tinham mais chance. Naquela época, o público não votava pelo telefone, então, a escolha era unicamente dos jurados (Sérgio Cabral,Salomão Schwartzman, Chico Anysio, gente de esquerda, de direita, a favor ou contra a guitarra, enfim, o júri era eclético), e o resultado a gente só saberia, é óbvio, na grande final, ao vivo. E que final, aquela de outubro de 1967!. A melhor de todas. Justamente a que ampliou a fama de Caetano, Chico, Gil, Edu Lobo, levou a irreverência dos Mutantes e suas guitarras ao sisudo teatro Paramount; colocou gola rolê e um casaco de tweed em Caetano; desmistificou o tal smooking preto dos demais cantores; tirou Gilberto Gil de uma crise de medo, estatelado no sofá, para levá-lo ao palco; fez Roberto Carlos, o rei da Jovem Guarda, cantar um sambinha; viu Elis Regina ser classificada como melhor intérprete, e ainda assistiu, boquiaberto, Sergio Ricardo atirar seu violão no público que o vaiava insistentemente, ou por ele ter mudado o arranjo ou porque "Beto, Bom de Bola" era ruim mesmo.
Todas essas imagens antológicas de 43 anos atrás, vistas e revistas ao longo dos anos em videotapes, não cansam nossas retinas e estão documentadas no filme "Uma noite ëm 67", de Renato Terra e Ricardo Calil, em cartaz desde o fim de semana passado. Mas, o que o documentário traz de saboroso são as entrevistas feitas nos bastidores com os jovens artistas nos seus verdes 20 anos, prestes a entrar no palco ou momentos depois de terem saído, no calor das vaias e aplausos. Entrevistas feitas por Cidinha Campos e Randal Juliano, dois conhecidos jornalistas dos anos 60/70 e cujas perguntas são tão curiosas quanto as respostas. Vale, também, o ponto de vista de cada um dos artistas, 40 anos depois. Não fossem as imagens de arquivo tão icônicas, seriam essas entrevistas o principal apelo do documentário. Deu vontade de viver tudo outra vez, mas sem a ditadura por trás.

segunda-feira, 5 de julho de 2010

O adeus

Alguns dias se passaram desde que nosso amigo de tantos anos - mais de 20 -, Alberto Guzik, partiu. Demorei um pouco para escrever algo sobre ele porque também estou tentando entender essa perda. Até agora ainda não percebo esse fato como sendo real, embora tudo me indique a realidade, a sua cremação, a missa de sétimo dia, a dor e a saudade das pessoas. Não sei para onde ele foi. Mas, certamente, acho que é um lugar de luz, como eram os palcos em que ele atuava e onde ele se sentia em casa.
Homem dos livros (escreveu alguns), do teatro (atuou, escreveu e dirigiu várias peças), do jornalismo (era um dos grandes críticos de teatro deste País, à época do Jornal da Tarde, onde trabalhamos juntos por 15 anos), um professor incansável, e dono de uma cultura que assombrava. Sempre tinha uma referência sobre o autor de um livro que a gente estava lendo, o filme que íamos ver, ou a peça que acabávamos de assistir. O cara conhecia mitologia grega profundamente, lia Shakespeare no original e poderia traduzir Jean Racine, se fosse preciso. Guzik era um Google com relevância e critério.
Sua partida nos deixa mais solitários. Quando uma pessoa querida morre, se vai com ela um pedaço de nós. A morte carrega nossas lembranças, nossos bons e maus momentos compartilhados, nossas referências. Um pouco da gente também morre, e a gente se entristece, chora e não se conforma, por mais estóicos que sejamos.
Só torço para que meu amigo tenha escolhido um bom lugar pra ficar, tomara que seja cheio de holofotes.

terça-feira, 8 de junho de 2010

Sem comemoração, por enquanto...

Guzik
Queria poder comemorar contigo seu aniversário amanhã, fora desse leito de hospital, dessa UTI, longe de médicos e enfermeiros, comendo bolo e bebendo um refrigerante na sala de tua casa, e vendo você já pronto e recuperado. Mas, infelizmente, não vai ser possivel ainda. As coisas não acontecem no mesmo ritmo que a gente planeja. Às vezes, ocorrem alguns desvios de rota, fazendo com que nosso caminho fique mais longo e tortuoso. Mas, mesmo que esteja demorando um pouco mais, sei que você sairá daí porque acredito na sua força, no seu otimismo e nas suas sete vidas que você demonstrou ter nesses três meses e meio de internação. Durante esse tempo todo, nunca vimos estampado eu seu rosto o sentimento de que estava perdendo a batalha, ao contrário, era você quem nos encorajava com suas palavras. É por isso que estamos cheios de esperança, queremos compartilhar da sua companhia de novo. E, em breve, comemorarmos o seu aniversário como você merece.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Guzik

Notícias do Alberto Guzik, nosso querido amigo, jornalista, ator, dramaturgo, escritor, que está no hospital há quase quatro meses. O relato abaixo é de Ivam Cabral, outro querido nosso.






foto: Laerte Késsimos

"Como já contei por aqui, no dia 16/02, o Alberto Guzik se submeteu a uma cirurgia de gastrectomia total (retirada total do estômago) com linfadenectomia expandida (retirada dos gânglios). Este procedimento, segundo nos explicou seu médico, obriga uma manipulação do pâncreas - para a retirada dos gânglios -, que começou a desenvolver pancreatite aguda - complicação comum neste tipo de cirurgia.

Durante sua recuperação, também apresentou "deiscência da sutura do esôfago com o intestino" - o grampeamento do esôfago com o intestino não cicatrizou - o que determinou uma saída de líquido intestinal pelo dreno; e sua pancreatite, aguda grave, iniciou um processo de necrose em algumas áreas. Como se não bastasse, Alberto também contraiu pneumonia e em seguida uma bactéria. Passou, então, por um terrível processo de recuperação.

Nos últimos dias, no entanto, Alberto estava sereno. Em nenhum momento reclamou de coisa alguma. Queria a recuperação para poder voltar ao trabalho, aos amigos, aos livros. Telefonei-lhe de Paris, na sexta, para dizer que o amava e que estaria ao seu lado quando voltasse da cirurgia.

Porque ontem, no momento em que a pancreatite, pneumonia e bactéria estavam sob controle, Alberto passou por mais um procedimento ainda para tentar solucionar a cirurgia de gastrectomia que não havia sido completada. Agora se recupera na UTI e seu quadro é estável, inspirando muitos cuidados.

E no dia 9 de junho Alberto faz aniversário..."

Guzik, querido, estamos todos concentrados na sua recuperação.

terça-feira, 18 de maio de 2010

Steinbeck, sempre atual

Acabei de ler, tardiamente, um livro lindo do John Steinbeck: The Winter of our Discontent (no Brasil, foi traduzido como O Inverno de nossa Desesperança). O nome é uma referência à frase dita por Ricardo III na peça de Shakespeare. Se ainda havia dúvidas na Academia, foi provavelmente a obra que faltava para o Nobel conquistado por ele em 1962. O autor de Vinhas da Ira, Ratos e Homens e Vidas Amargas (East of Eden) esmiuça a vida de Ethan Hawley, um sujeito simples do interior dos Estados Unidos, chefe de família e empregado de uma mercearia. Aborda a sua crise moral diante de tantos apelos à corrupção da pequena cidade (fictícia) de New Baytown e seu conflito interno para não ceder a esses chamados do lado "negro da força". Falava mais alto a pressão dos filhos para terem uma tevê e um carro. Corria o ano de 1961, e era inadmissível a uma família americana não possuir um automóvel, uma tevê, uma máquina de lavar. Essas coisas que formam a base da sociedade americana (o consumismo). Ethan era um homem que prezava os valores da pátria e da família, mas precisou encarar alguns desvios de conduta, e a vida passou a ficar meio complicada... Enfim, um livro e tanto, com uma prosa fluida e gentil com o leitor.

Destaco aqui um dos trechos mais comoventes:
Acho que somos todos, ou pelo menos a maior parte de nós, guardiões daquela ciência do século 19 que negava a existência de qualquer coisa que não pudesse medir nem explicar. As coisas que não éramos capazes de compreender continuavam acontecendo, mas não tinham a nossa benção. Não enxergávamos o que não éramos capazes de explicar e, por isso, uma enorme parte do mundo ficava abandonada às crianças, aos loucos, aos tolos e aos místicos, que estavam mais interessados no NO QUE do que NO PORQUÊ. TANTAS COISAS ADORÁVEIS E ANTIGAS ESTÀO GUARDADAS NO SÓTÃO DO MUNDO...Não as queremos por perto, mas não temos coragem de jogar fora.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

...

Estou um pouco afastada do blog, das coisas. Flutuo no tempo. Continuo cultivando meu hábito de ir ao cinema e ao teatro, mas estou sem nada interessante para destacar neste momento. A vida anda. Às vezes célere, noutras um pouco mais devagar. Mas poupo meus quatro leitores de digressões vazias e desprovidas de qualquer importância neste momento. Volto logo.

domingo, 11 de abril de 2010

Piratas brasileños

No meio de frutas, legumes e pasteis, um novo item está sendo vendido nas feiras de São Paulo. CDs piratas de filmes. Começo a achar que as locadoras de vídeos estão com os dias contados, ou ficarão limitadas apenas a títulos de seriados americanos e aos cults. Eu, mesma, já vi na frente de um cinema (eles são muito caras-de-pau) um sujeito vendendo títulos totalmente cultuados pelos cinéfilos, com assinaturas de Godard, Antonioni, Pasolini. Incrível! A gente vê à venda, em banquinhas improvisadas ao lado do metrô e nas calçadas da Paulista, lançamentos de filmes que nem chegaram ainda às telas dos cinemas. Já estão prontas as cópias do novo Woody Allen, por exemplo, e alguns títulos que nem estão em trailers no cinema... Carregando meus caquis, batatas e alfaces, perguntei ao ambulante sobre a qualidade desses CDs, e se eram legendados. Ele me disse que todos os seus "produtos" têm qualidade de DVD, e,agora, dispõe de legendados e dublados porque as pessoas têm preguiça de ler... Quase caí pra trás. Quer dizer que a indústria da pirataria se sofisticou a esse ponto? E o Chico Xavier? Esse nao tenho ainda, a qualidade da cópia é muito ruim, prefiro não vender para não prejudicar o meu negócio, me disse o cara, com sotaque castelhano. Na verdade, os ambulantes estão fulos porque não conseguem piratear filmes brasileiros. Bom, só faltava esta.

domingo, 28 de março de 2010

papo de rua

Dois homens conversando na rua. Um deles larga essa:

"Se você for casado, hetero, fiel e branco está ferrado. O bom hoje é ser meio gay, negro e infiel. Aí, sim, você conquista a mulherada e o chefe."

Quase pedi para ele repetir. A gente ouve cada uma...

sexta-feira, 5 de março de 2010

crença

Existem momentos em que precisamos ter fé, acreditar e orar por algo que desejamos muito. Apesar de, às vezes, ser tentada a compartilhar das ideias do biólogo inglês Richard Dawkins,para quem a vida é feita só de acasos e evidências, neste momento preciso muito crer em algo que vá além, muito além. Por isso, rezo e desejo, mesmo que possa ser tudo ilusório.

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

O Segredo de Teus Olhos


O novo filme argentino de J.J. Campanella, "O segredo de teus olhos", pode ser que não ganhe o Oscar de melhor filme estrangeiro porque o "Fita Branca", do Michael Haneke, está muito cotado. Dos concorrentes a essa categoria só vi o argentino. E adorei.
Eles continuam fazendo filmes muito bons, ancorados em ótimos diálogos, atores expressivos (Ricardo Darín é um caso à parte), direção precisa e fotografia belíssima. Neste caso, até a maquiagem usada para destacar o envelhecimento dos personagens está perfeita, coisa não muito fácil no cinema. Especialmente quando a câmera é pródiga nos planos fechados e closes.
Fico me perguntando sempre: por que a gente não consegue esse resultado nas nossas telas? Sei que é um clichê falar isso, já que todos que saem da sessão fazem o mesmo questionamento.
Por que os argentinos conseguem retratar o seu cotidiano, a sua classe média, os seus problemas, o seu legado (ditadura, crises) de forma tão poética e envolvente? Mesmo que o roteiro emule alguns recursos já filmados pelo mesmo diretor (misturar passado com presente, evocar a ditadura), tudo parece novo. Até um romance, enredado entre idas e vindas, passado e presente, com direito a uma longa cena de despedida na estação de trem, Campanella faz bem e sem cair na pieguice.
Eu gosto e tenho carinho pelo cinema brasileiro. Mas nas nossas telas (com raras exceções) a estética pesada da violência e das drogas é uma obsessão. Queria tanto ver um cinema brasileiro tão bom (e realista) quanto o da Argentina, país que também tem violência, drogas, pobreza, (teve) ditadura e uma imensa classe média. E, para nos humilhar ainda mais, Campanella reúne em "O Segredo.." o suspense de um thriller policial, comédia e romance, Ai que inveja!

p.s. Dois filmes brasileiros dos quais gostei muito por terem fugido do tema favela/violência foram À Deriva, de Heitor Dhalia, e É Proibido Fumar, de Anna Muylaert.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Mais um

Hoje meu sobrinho acrescentou mais um item para a lista aí debaixo:

Vou ser tia avó.

Mas, desta vez, fiquei contente. ;-)

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

envelhecer

Sinais (importantes) de que você pode estar ficando velha:

1) Na rua, mesmo com a melhor produção de roupa e maquiagem, é como se estivesse invisível para todos os homens

2) As pessoas começam a te chamar de senhora com muita frequência

3) Nas fotos digitais, um desastre, os detalhes mais ressaltados são os vincos do rosto e aquele olhar de pálpebra caída pedindo, pelo amor de Deus, uma plástica

4) Sobrinhos de 30 anos te chamando de tia

5) Gente que não te vê há um tempão vem com essa: "você está muito bem!"

6) Jovens começam a te oferecer lugar no metrô

7) Olheiras profundas de manhã, mesmo que você durma sete horas por noite. Em noites de insônia, então, nem é bom olhar no espelho no dia seguinte

8) Memória falha na hora de lembrar aquele ator de um filme importante, cujo diretor era um dos seus preferidos. Mas não consegue lembrar o nome de nenhum dos três naquele momento

9) Precisa de cálcio, hormônio e vitaminas diariamente

10) E um dos mais graves sinais (esse é de arrasar): quando você pede meia entrada no cinema, ninguém te pede para apresentar documentos

domingo, 17 de janeiro de 2010

terremoto

Haiti, todos choramos por ti.
O professor Eduardo Felipe, doutorando em História Social e um especialista no escritor Alejo Carpentier, lembrou bem, na Folha de hoje, o que o cubano nos relata em seu livro "No Reino deste Mundo": que a beleza do ser humano está em sua própria miséria, na sua capacidade de amar, mesmo sendo esmagado pelos sofrimentos e pela calamidade.
É o que esperamos desse povo tão sofrido e esquecido, e que hoje vive sua maior tragédia. Tudo já foi dito sobre o terremoto do Haiti. Eu não consigo sair da frente da CNN. É tão surreal ver aquelas cenas de horror, corpos sendo desovados em caçambas de caminhão e depositados em valas comuns, sem sequer uma identificação, um adeus, uma oração, sei lá. Lembra o holocausto. Além da água, comida, cuidados médicos e um teto, tudo o que os haitianos precisam agora é de muita coragem.

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

A bolsa ou ... o celular

Domingo, 9h da noite. Calor em São Paulo. Eu descendo a rua para ir ao supermercado. De repente, uma mão aperta meu braço esquerdo e diz: Vem comigo. Eu levo um susto e alguns segundos para perceber que aquilo não era uma cantada ou alguém querendo me levar para beber uma cerveja. Era um assalto.
Olhei pro cara, era alto, magro e de boné (por que todos usam bonés?). Disse pra mim mesma, tou ferrada. Ele tentava me empurrar pra frente como se quisesse me levar pra algum lugar. Insegura, mas não em pânico, eu empaquei e dali não saía, porque apesar de não ter viv'alma na rua, pelo menos eu tava pertinho de um hospital, onde sempre tem muito movimento de gente chegando ou saindo. Ele me dizia e repetia: Me dá a bolsa e não se preocupe, não vou fazer nada contigo, não quero nada além da sua grana, nem o celular eu quero, nem documentos, nada! Bom, menos mal,pensei, o cara é decidido e aparentava sinceridade. Aproveitando essa "abertura" eu dei uma checada se ele estava armado. Em frações de segundo, arrastei meu braço no corpo dele para sentir se a cintura tinha algo escondido. Nada, a não ser um abdome tipo tanquinho. Fiquei mais tranquila e disse que precisava pegar a chave para poder entrar em casa. Então perguntei, o que você vai querer com uma bolsa de mulher? Ele disse que não queria nada, só o dinheiro. Arranquei os únicos trocados que tinha na carteira (20 reais)e entreguei. O sujeito, impaciente com minha pobreza, se espanta. É só isso? Me dá o celular também. E ainda argumentei, esse celular é instrumento de trabalho, tem tudo ai dentro! Ele nem piscou. Pegou o aparelho, que nem era tão bom assim,e encerrou o caso. Eu me virei para subir a rua do lado contrário de onde estava indo. Ele ainda segurava o meu braço e eu cheguei a acenar para umas pessoas que estavam passando do outro lado, mas eles nem deram bola, poderiam achar que aquilo era uma briga de namorados. Ele insistiu para que eu seguisse o caminho original, ou seja, rumo ao supermercado, vamos pro lado que você 'tava indo, eu te acompanho. E eu: não vou descer com você nessa escuridão! Já chega, você já teve o queria, me deixa em paz. Ele me puxou ainda numa última tentativa, mas acho que também estava muito nervoso para ficar brigando e se mandou. Livre do cara, subi a rua do lado contrário dele e fui pra minha casa. As pernas estava meio frouxas, encontrei um monte de gente na rua depois. Fiquei besta como as coisas acontecem assim, na rua, e ninguém vê.

Já na segurança da minha casa eu pensei que aquilo poderia ter sido um pesadelo, uma tragédia, um horror, uma violência. Mas não foi. Foi só uma tentativa desesperada de um sujeito para assaltar uma pessoa à mão desarmada, levando qualquer coisa que ela oferecesse. Sim, porque a única coisa que ele tinha na mão era um celular, e que, provavelmente, também havia sido roubado.
Eu sei que fiz tudo ao contrário do que está escrito no manual das vítimas de assalto. Reagi, argumentei, acenei para outras pessoas, segurei a bolsa como se ela escondesse o diamante da pantera cor-de-rosa e não segui o caminho com ele. Me disseram, você é louca! Acho que fui louca sim. Mas só agi desse modo maluco porque senti segurança no momento para não ceder ao que ele pedia. Mas não recomendo a ninguém fazer o mesmo. Nunca se sabe o tipo que vamos encontrar pelas esquinas.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

dolce far niente

Fiquei recolhida com minha família durante esses 10 dias dos feriados de fim de ano numa casa de campo no sul de Santa Catarina, a uns 4 km de uma cidadezinha de uns 50 mil habitantes. Ir a uma padaria, a um supermercado ou a uma banca de jornais ali da esquina, nem pensar. É preciso se programar e pegar o carro. Preferia ficar ali mesmo (pois foi para isso que fui), na companhia de meus familiares e de meus livros, dos cachorros de minha irmã (e são muitos) e do canto dos passarinhos. Eles nos acordam às 6h da manhã e cantam o dia inteiro, acho que de alegria. Estranha a sensação de ser acordada por pássaros para quem é incomodada todas as manhãs pelo ronco dos carros zunindo da 23 de Maio, em São Paulo. Ali, entre uma leitura, um lanche, uma soneca, uma conversa, o som mais forte vem do latido dos cães que saem do seu marasmo para saudar qualquer vivente que passe na frente da casa. Sejam vizinhos ou estranhos, os cachorros fazem uma orquestrada algazarra. Acho que se divertem com isso. Depois se recolhem ao seu canto e dormem, de novo. Sua vida é assim mesmo: dormir, comer, latir, voltar a dormir. Se fossem homens cairiam em depressão? Talvez. De vez em quando um quero-quero ou um sabiá desce para beber água deixada num potinho. Se ele não for rápido o suficiente o cachorro avança e o bichinho já era. Lei do mais forte. Lá nos fundos, uma horta com tomates, alfaces, couve, milho, abóbora, radiche, salsinha, cebolinha, quase tudo para nossa salada fresca. Tive dificuldades para encontrar o pé de alface! Na verdade, ele estava meio escondido, e eu confundi a alface com a chicória no que fui muito zoneada em casa.
Minha irmã, generosa como é, fazia pão numa dessas máquinas modernas ou assava um churrasco para nós, apesar de ser vegetariana.
Como não tínha internet, já que os cabos da banda larga não chegam lá e a 3G celular ainda é quimera, meu computador ficou inerte e serviu apenas para eu revisar meus textos. Do celular, às vezes, recebia algum sinal de vida com torpedos ou ligações de amigos em viagem.
Estranhei muito todo aquele tempo disponível e o silêncio envolvendo a gente. Foram apenas alguns dias, mas parece que vários meses se passaram. Gosto do ar bucólico do campo, daquelas cores do entardecer, do aroma do mato, mas sou uma pessoa visceralmente urbana, e já estava com saudades das buzinas dos carros na minha janela e das inúmeras possibilidades que a cidade grande me oferece.